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De: Fabianne Batista Balvedi
Enviada em: quarta-feira, 3 de dezembro de 2008 14:42
Para: WEC 2008
Assunto: Carta Aberta à organização do WEC2008


Caras/os,

Meu nome é Fabianne Batista Balvedi e sou Arquiteta e Urbanista, registrada no CREA-PR sob o número 64968.

No início deste ano, fui convidada a fazer parte do GT Mulher Curitiba, convite que aceitei com muito gosto. Logo no primeiro encontro, fomos incentivadas, eu e as demais colegas presentes, a participar do WEC2008 tanto como grupo como individualmente.

Como grupo, construímos um texto coletivo a muitas mãos, cujo desafio por si só já teve um valor inestimável. Mesmo cada uma tendo sua opinião, conseguimos sintetizar as idéias em harmonia, ao mesmo tempo que aprendemos a usar novas ferramentas de tecnologia social para driblar a falta de tempo e a impossibilidade do encontro presencial. O resultado foi um texto que teve consistência e qualidade suficientes para ser aprovado e apresentado no Fórum da Mulher.

Individualmente, eu e outra companheira encaramos o desafio de enviar um paper sobre nossas pesquisas atuais. E também conseguimos aprovação de nossos trabalhos, que seriam apresentados durante as sessões temáticas do WEC2008.

Ao ser notificada por e-mail pela organização sobre a aprovação, fiquei muito feliz e encaminhei a informação para a lista de trabalho do GT Mulher Curitiba perguntando sobre alternativas para a viagem até Brasília, uma vez que a comitiva de convidados do CREA-PR havia sido fechada algumas semanas antes, e eu não estava entre as/os convidadas/os. Recebi muitas felicitações das colegas e várias dicas para conseguir passagem e estadia mais baratas. Ao mesmo tempo, escrevi para a organização do evento perguntando sobre a inscrição e sobre a publicação nos anais, caso eu não pudesse ir. Responderam-me que "todos os palestrantes terão a inscrição paga", resposta ambígua que me fez acreditar que a organização é que arcaria com o custo. Era o mínimo que esperava pela minha disposição em comparecer ao WEC2008 por conta própria para compartilhar meus conhecimentos com os presentes, contribuindo para o sucesso do evento.

Tendo isso em mente, consegui reservar parte de minha renda para comprar a passagem de avião ida e volta para Brasília, e um amigo solidariamente me ofereceu hospedagem sem custo. Então escrevi para a organização confirmando minha presença.

Eis que, no dia seguinte ao envio do referido e-mail, chega outro da organização solicitando novamente que confirmasse minha ida, desta vez pedindo para que eu não esquecesse de pagar a inscrição. Fiquei surpresa e perguntei na lista de trabalho do GT Mulher se o mesmo havia acontecido com outras participantes, o que me foi confirmado. Escrevi então novamente à organização perguntando sobre o mal-entendido e encaminhando o e-mail anterior, que foi ambíguo. Como não obtive resposta, escrevi novamente. Nada. Então liguei para Brasília, para falar com alguém pessoalmente. Quem me atendeu confirmou a necessidade de inscrição e, apesar de concordar comigo no fato de que a isenção desta taxa seria o mínimo para um palestrante, disse que nada podia fazer, pois eram ordens "de cima". Foi então que comecei a questionar seriamente a minha ida ao evento.

As mulheres do GT, ao ver minha relutância, até esboçaram uma tentativa de arrecadar fundos coletivamente para me ajudar. Mas, antes que qualquer cenário nesse sentido fosse formado, acabei decidindo definitivamente não participar do evento, pois, a cada análise que fazia em minha mente, mais incoerências encontrava, e por isso hoje escrevo esta carta. Para explicar por que não fui.

Entendam: o tema-base em que o artigo se encaixa é o "TIC para Inclusão". Analisando com imparcialidade, perguntemo-nos: como universalizar os acessos, que é disso que trata a inclusão, se, para se PROPOR algo para a INCLUSÃO, a EXCLUSÃO já aparece na hora de se APRESENTAR SOLUÇÕES para um público que poderia (?) fazer a diferença? Vocês percebem a incoerência explícita?

Como um pesquisador de mestrado com bolsa integral do CNPQ em Curitiba, por exemplo, teria condições de atender a um evento como este? Com dedicação exclusiva, ele não pode, em tese, ter outros tipos de trabalho, e, por isso, a bolsa de R$ 1.200,00 é sua única renda. Sendo o custo total para comparecer ao evento, incluindo passagens, inscrição e estadia, aproximadamente R$ 1.300,00, isso abocanharia toda a bolsa de um mês inteirinho de pesquisa e mais um pouco. Sim, isso mesmo! É só somar: passagem ida e volta pela Gol: R$ 789 + Inscrição: R$ 200 (se conseguir inscrever-se como estudante) + 4 diárias de R$ 75,00 se ele não conseguisse hospedagem solidária.

Só a inscrição já representa 1/6 da renda mensal de um pesquisador que conseguisse se qualificar como estudante, 1/4 se comparecesse como profissional. Que dirá então a situação de pesquisadores/estudantes que não recebem bolsa. E, para os que estudam em faculdades particulares, o custo representa aproximadamente 1/4 do preço das mensalidades (!).

E os professores, então, que têm de pagar como profissionais? A inscrição representa a renda de aproximadamente 23 horas/aula de professores auxiliares universitários com especialização. Imagino que a situação para outros/os profissionais não seja muito diferente. Poucos são os que podem dispor desse dinheiro sem grande sacrifício.

Além dessa exclusão explícita, a realidade apresentada é que o conhecimento que estudantes e profissionais estão indo generosamente compartilhar através de seus papers não lhes confere diferencial nenhum. Quem vai só para receber conhecimento tem praticamente o mesmo tratamento que quem vai para compartilhar. Quem quer compartilhar tem que PAGAR a inscrição para poder fazer isso! A única exceção é para palestrantes convidados, o que evidencia ainda mais a característica excludente do evento.

Qual o verdadeiro objetivo desse evento, então?

Qual é a mensagem embutida nisso tudo?


Atenciosamente,

Fabianne Batista Balvedi
CREA/PR 64968

P.S.: O paper será publicado nos anais da conferência mesmo havendo ausência de apresentação oral, conforme previamente informado pela organização e permitido pela licença do documento. O conteúdo está disponível através do link http://estudiolivre.org/paperEL


Última alteração: 04/12/2008 às 23:20, por: fabs