Blog: blog da fabs


Descrição

Última modificação em: 27/12/13 - 03:34     Fonte RSS

Descobertos e (re)misturados

Artigo feito sob encomenda para a edição n.45 da Revista ABCDesign, codinome "Origens"

por Fabianne Balvedi



Era junho de 2004, e eu estava em uma das apresentações mais badaladas do FISL V – Quinto Fórum Internacional Software Livre.

Apesar de trabalhar com programas de código aberto desde 2001, fazia muito pouco tempo que eu havia começado a realmente compreender o significado da complexa filosofia por trás de todo aquele movimento. Era também a minha primeira vez no evento e eu me sentia completamente encantada. Com aquele sentimento do tipo “que bom que existe gente assim nesse mundo”.

Na época do evento, eu colaborava principalmente com a lista de discussão dos articuladores de cultura digital, um para-raios de pessoas interessadas em hackear o Ministério da Cultura para promover um programa de fomento e difusão cultural a partir de bases fundamentadas na produção cultural de sociedades civis organizadas. Essas articulações ajudaram a fundamentar o que veio a ser o projeto dos Pontos de Cultura, o do-in antropológico capitaneado pelo Programa Cultura Viva e que hoje busca ser transformado em lei.

A apresentação em questão celebrava o lançamento no Brasil das Creative Commons – uma suíte de licenças de uso que têm como objetivo flexibilizar os direitos autorais de uma obra a partir de uma decisão do autor/a em liberar uma parte ou seu todo para uso, reuso, remix ou até mesmo colocá-la totalmente em domínio público. Segundo seus desenvolvedores, o objetivo seria trazer para os bens culturais a mesma filosofia de compartilhamento existente no software livre. O uso dessas licenças era um tema frequente nas conversas da lista dos articuladores, e por isso muito me interessava.

A mesa de celebração contou com a presença do então Ministro da Cultura, Gilberto Gil, que declarou que o modus operandi das redes de software livre poderia servir como “instrumento de desapropriação dos latifúndios que hoje dominam a indústria cultural.” Um dos principais fundadores da entidade homônima que criou as Creative Commons, Lawrence Lessig, também presente na mesa, alertou para marginalização que os defensores da liberdade de software vêm sofrendo em seu próprio país, os Estados Unidos. “Partilhar, dividir e distribuir são vistos como atividades subversivas. Hoje há uma verdadeira guerra do copyright. E quem não adere é terrorista. Então, até as crianças, quando fazem suas pesquisas na rede, são terroristas?”

De todas as falas desse dia memorável, a que mais me tocou foi a do então diretor da Escola de Direito da UFRJ, Joaquim Falcão. Como na música de Caetano Veloso, não por conta de seu conteúdo exótico, mas pelo fato de, até aquele momento, ter ficado oculta em minha mente, quando teria sido óbvia.

Coube ao Prof. Joaquim proferir a primeira das palestras da mesa. E, nessa introdução, sabiamente buscou, em algumas de nossas origens, como nos tornamos a quarta parte do mundo, uma conexão com a presente celebração: o fato de que o livre fluxo das informações contidas nas cartas documentais escritas à época dos descobrimentos foi “fundamental para a empiricização, descentralização e diversificação do progresso.”

Os navegadores escreviam cartas como relatórios, uma prestação de contas a seus reis e financiadores, escritas a partir de suas observações durante as viagens. Depois de lidas por seus destinatários, as cartas navegavam livremente de mão em mão, de cidade em cidade, anunciando as novas descobertas. A Américo Vespúcio, “descobridor” do Novo Mundo, atribui-se a escrita de pelo menos cinco cartas. Dessas, apenas três tem sua autoria comprovada: as cartas de Sevilha, de Cabo Verde e de Lisboa. As outras duas seriam apócrifas, de autenticidade não comprovada: as cartas Mundus Novus e Quatro Navegações. Segundo o professor, foi o livre fluxo dessas cartas que ajudou a tecer a rede das comunicações do século XVI.

A carta de Lisboa foi a mais fundamental de todas, pois corrigiu o erro histórico de Colombo de achar que chegara às Índias e registrou corretamente a chegada a um mundo ainda desconhecido pelos europeus. “A carta de Lisboa servirá de base para a Mundus Novus”, relata o professor. “Entendendo sua construção e circulação, seguindo seu rastro e paradeiro, entendemos o erro de atribuição de autoria e avaliamos suas conseqüências para os dias de hoje, diante do desafio de regulamentar o fluxo de informações por meio do direito autoral.”

Um desconhecido manuscrito em italiano intitulado de “Máximas saudações de Américo Vespúcio a Lorenzo di Pierfrancesco dei Médici” teria originado a escrita da Mundus Novus. Título nada atrativo, numa língua restrita, de difícil circulação. Sua primeira modificação foi passar do italiano de poucos para o latim de muitos. Uma nova edição feita em 1504 descartou as burocráticas “Máximas Saudações” do título e em seu lugar surgiu “Mundus Novus”.

Em 1505, Johann Froschauer acrescentou imagem ao texto com a primeira xilogravura sobre o novo continente. Com imagem e texto, permitiu-se ao leitor ver o inenarrável e dessa forma acendeu-se a imaginação de todos, atiçando ainda mais a curiosidade sobre as novas terras. Mundus Novus é um panfleto, um cordel que, propositadamente ou não, serviu de publicidade para nossa colonização. E também para outro erro histórico: o erro de atribuição de autoria que nos fez nascer americanos.

“Imaginemos, porém, que Mundus Novus tivesse sido escrita por Vespúcio hoje”, pede o professor. Quais seriam as consequências? O que fariam os advogados de Vespúcio ao tomarem conhecimento das sucessivas alterações, traduções e das múltiplas edições não expressamente autorizadas por seu cliente?

Uma das mais prováveis respostas é que tentariam proteger os direitos autorais. E também muito provavelmente teriam sucesso em seus pleitos. Américo Vespúcio morreria mais rico, porém anônimo, pois o erro de autoria possivelmente também teria sido evitado. Mas o século das descobertas também teria muito menos leitores. Segundo conclusões do professor, “talvez Montaigne, Boticelli, Da Vinci, Erasmo e outros navegadores e potentados não tivessem lido Vespúcio. O livro Utopia talvez tivesse sido retirado de circulação. Não teria chegado até nós. A imaginação européia teria sido menor. Thomas Morus seria menos. No máximo, um plagiador. E, se assim ficasse para a posteridade, não teriam ingressado no mundo da cultura obras intelectuais tão distintas quanto a Nova Atlântida, de Bacon, as Viagens de Gulliver, de Swift –obras diretamente inspiradas pelo relato de Morus. A própria palavra 'utopia', por ele inventada, poderia não existir.”

Difícil pensar em um mundo ausente de reflexões utópicas. Mas, ao que tudo indica, parece ser um rumo que boa parte da humanidade escolheu. Hoje, 9 anos depois, o recente suicídio de Aaron Swartz, cofundador da Creative Commons, processado impiedosamente pelo governo dos EUA por supostos downloads ilegais, nos faz perceber que o cenário pintado por Lessig não somente continua a existir, mas parece ter piorado ainda mais. No Brasil, a atual legislação não considera a potencialidade do desenvolvimento científico e tecnológico mundial a partir das tecnologias digitais de informação e comunicação, que tem possibilitado um avanço significativo no acesso e circulação das informações e das culturas entre as pessoas. Restringe de forma intensa a possibilidade de cópia e troca de informações, inclusive para fins educacionais. A reforma da Lei do Direito autoral proposta em 2007 está parada e o Marco Civil da Internet não consegue sair do papel.

Tempos difíceis para os navegantes do século XXI.

...

Links relacionados:

O que é o software livre?
http://www.gnu.org/philosophy/free-sw.pt-br.html

Fórum Internacional Software Livre
www.fisl.org.br

Creative Commons Brasil
http://creativecommons.org.br/

Pontos de Cultura
http://www.cultura.gov.br/pontos-de-cultura1

Reforma LDA
http://www2.cultura.gov.br/site/tag/reforma-lda/

Marco Civil da Internet
http://culturadigital.br/marcocivil/

Mundus Novus: por um novo direito autoral
(artigo do Prof. Joaquim Falcão)
http://direitogv.fgv.br/publicacoes/revista/artigo/mundus-novus-por-novo-direito-autoral

Esta obra está sob uma Licença Creative Commons Atribuição-CompartilhaIgual? 3.0 Não Adaptada: http://creativecommons.org/licenses/by-sa/3.0/deed.pt_BR

tags: direito autoral, cultura, revista, história, acbdesign, marco civil internet, remistura, origens, cartas apócrifas

enviada por: fabs em: 03:34 - 27/12    |    permalink    |    comentar

Crawleando

XFN


Hoje finalmente tirei um tempinho pra me livrar do twitter sendo publicado no meu buzz por conta do serviço não oferecer conexão fácil com pods do status.net. Explico: eu praticamente não uso o twitter. minha conta lá só serve pra replicar meus posts do identi.ca, que está em um servidor comunitário mantido pelos desenvolvedores do status.net. Basta ler os termos de uso dos dois para entender porque eu confio muito mais no pod identi.ca do que na baleia twitter. Mas se você está com preguiça de ler termos de uso, basta entender que o backend do twitter é fechado, enquanto todo código do status.net é aberto. Pra mim isso já basta pra preferir um ao outro. Porém, se ainda quiser saber mais, tem esse artigo aqui do Cleiton Lima que ajuda a desvendar melhor o bichano.

Bem, já que estava nesta função, resolvi também puxar pra lá meu blog do estudiolivre.org, cujo mofo digital estava ficando vergonhoso (último post em 12/08/2010, como assim??). Naquele esquema, vai arrumar a gaveta e acaba se empenhando com o armário todo, hehe :-)

Então este post na real é mais pra testar se vai funcionar o esquema de colocar o esse rel-me do google profile no corpo do blog, seguindo este howto aqui.

A ver.

UPDATE: deu certo! eeeeeeeeee

UPDATE 2: o crawler do google achou, mas o buzz ainda não. Vamos ver se é questão de tempo ou o quê. Novamente, a ver...

tags: crowl, buzz, status.net, identi.ca

enviada por: fabs em: 22:48 - 12/03    |    permalink    |    comentar

e-drugs e o poder do som



enton, resolvi escrever este pequeno post hoje porque a Carla Betioli compartilhou no buzz o link para um artigo sobre a nova mania da França, as e-drugs:

http://br.noticias.yahoo.com/s/11082010/40/politica-drugs-novo-fenomeno-da-internet.html

essa onda é muito doida, porque na real o que está rolando é que as pessoas estão acordando e se conscientizando cada vez mais para o fato de que o som tem um poder muito, muito grande sobre nós.

a sintonia anda tão forte que alguns meses atrás meu amigo Daniel Allegretti descobriu um livro sufi na biblioteca Vedanta e me emprestou. O livro se chama Music, é de autoria de Inayat Khan e foi comprado no Kashmiri Bazaar de Lahore, Paquistão. Gostei tanto do que li que copiei e passei adiante para várias pessoas.

mas hoje descobri que os textos já estão digitalizados:

http://www.sufimessage.com/music/index.html

leitura mais que recomendada. Pena que só encontrei edições em inglês. Se alguém souber de alguma tradução para o português, por favor, avise.

aos mais céticos, recomendo antes que assistam ao filme Camelos Também Choram:

http://www.contracampo.com.br/64/camelostambemchoram.htm

o filme documenta, entre outras coisas interessantes, uma cura através de música feita em um animal, ou seja, um ser que geralmente não é sucetível a placebos e muito menos a sugestões psicológicas.

agora, sobre o som e seu potencial de dar uns baratos, recomendo que se provem algumas pílulas brazucas do Renato Fabbri:

http://www.estudiolivre.org/el-gallery_view.php?arquivoId=7962

eu estava em retiro espiritual a primeira vez que ouvi, ou seja, provavelmente isso potencializou ainda mais o efeito dessas simetrias sobre mim, pois o estado de vibração que senti em meu corpo perdurou por mais de 24 horas. Como diria o próprio autor, é "da hora" ;-)

.


tags: musica, poder, som, drogas, cura, sufi, e-drugs

enviada por: fabs em: 15:59 - 12/08    |    permalink    |    comentar

Um arraial sem arraiá

image

ilustração: Fingi calma


Dizem que de médico e louco todo mundo tem um pouco. E que a turba submidialógica que passou por Arraial D'Ajuda durante o mês de maio é louca, não se tem muita dúvida. Mas que também somos um pouco médicos/pajés/curandeiros, bem, sobre este fato acho que não se refletiu muito não. Então vamos lá.

Entendo que o adjetivo tem se aplicado mais no sentido de um diagnóstico do que de uma cura propriamente dita. Pois houveram boas ponderações sobre os males que assolam Arraial, mas poucas propostas para um encaminhamento efetivo de sua solução. Só que o submidialogia, na minha opinião, tem ação mais homeopática que alopática. Mais causal que paliativa. E que independente de sua quantidade, a dose homeopática aplicada com certeza afetou o âmago de muitas questões. Só que isso é algo que vem de meu intuitivo, portanto sem chances de colocar em uma tabela pra demontrar sua validade (ok, petrobrás?). Tampouco estou discorrendo tese de mestrado por aqui. ;-)

Esta constatação também não é externa a mim, pois também eu fui mais homeopática que alopática em minhas interações. Então ainda bem que a web me permite a continuidade do trabalho, pois poucas homeopatias funcinam apenas em dose única. Se vai servir para algum trabalho futuro e de maior permanência e resgate da região, isso eu não sei. Mesmo porque eu não moro por lá e muito menos estudei profundamente o contexto da cidade. Porém, por vezes uma visão rápida de fora nos dá um insigth, e é isso e nada mais que isso que vou compartilhar na minha reflexão por aqui.

O insight de que falo veio da conversa de madrugada com o Escorrega, motorista da kombi que nos levou até o aeroporto na volta. Eu e Drica dormimos quase que o trajeto inteiro, porém em um dado momento fui acordada pelo rapaz me perguntando se poderia dar carona a outro rapaz. Resolvida a questão, puxei conversa e perguntei pra ele sobre a onda de vendas de imóveis que estava acontecendo na cidade, das inúmeras pousadas que a cidade abrigava que estavam vazias, etc. Ele respondeu que Arraial já estava "caindo de moda", e concordou comigo que este tipo de turismo que existe hoje por lá não é sustentável mesmo.

(Aqui me permito um parênteses importante para relembrar uma fala de tininha em nosso quarto, comentando sobre alguns hippies. De que é geralmente esta tribo que descobre os lugares paradisíacos, mas que depois acabam "infestados" pelo turismo predatório devido à sedução das oportunidades de lucro que se apresentam nestes cenários.)

Vendo algumas bandeirinhas ao longe, resolvo então do nada perguntar: e as festas juninas? É quando então sua voz fica meio embargada, denotando uma profunda nostalgia. Me conta que as festas juninas em Arraial D'Ajuda eram uma delícia. Aconteciam sempre na praça da igreja e envolviam todos os moradores da cidade. Mas que em um determinado momento, a cidade passou a ficar muito "chique", e aí o prefeito transferiu a festa pra outro local, pra longe do centro e de sua mini Oscar Freire, que atende pelo singelo nome de Rua Mucugê. Ou seja, obviamente, rolou uma higienização da cultura popular por lá.

E a conversa prosseguiu assim, ele me contando das tradições perdidas, das coisas que ele mais gostava e também de que muitas pessoas de fora gostavam. Me disse que muita gente de cabeça boa que foi pra arraial se decepcionou com a elitização e foi embora. Que quase só ficaram os oportunistas, mas que agora até estes estão sendo forçados a sair fora porque o lucro fácil do turismo já não está mais tão fácil assim, ao que me perguntei internamente: não seria este refluxo um mal necessário?

Sei lá. Só sei que Arraial D'Ajuda parece mesmo estar com sua essência avariada. Mas acredito sinceramente que ela pode ser resgatada se seus moradores conseguirem sair do embotamento do lucro rápido em que caíram para encontrar novamente suas raízes e revitalizar suas conversas sobre seus destinos. Porque, citando Ximena D'Ávila, toda dor e sofrimento pela qual se pede ajuda é de origem cultural, surgem de uma história de negação cultural. E a "prescrição" recomendada nada mais é do que o mais puro e simples conversar liberador.

Por isso não tenho dúvida de que os encontros submidialógicos são também processos de cura. Mas geralmente esta cura se restringe mais ao grupo que propõe e organiza o encontro do que à comunidade do espaço físico onde o encontro acontece. E talvez assumir isso que seja o mais importante de tudo. Porque dá um exemplo concreto, mesmo a quem só assiste de fora, de como uma rede pode funcionar e se auto-curar, deixando-se ver por dentro de suas entranhas, aberta e mutante em todas as suas conexões.

Aula prática de anatomia dentro de um organismo vivo.

E onde os órgãos somos nós mesmos.


tags: submidialogia, subarraial, arraial d´ajuda

enviada por: fabs em: 16:50 - 07/06    |    permalink    |    (2) comentários    |    comentar

Festival de Cultura do Paraná 2009

Começa amanhã o Festival de Cultura do Paraná, edição 2009.



E ontem fui até a sede do Soylocoporti conversar sobre minha participação na mesa sobre Mídias Livres e Comunicação compartilhada. Uma pena que quase todas as pessoas previstas para o debate não poderão comparecer. Muitos eventos acontecendo ao mesmo tempo, inclusive o Fórum de Cultura Digital em São Paulo, para o qual também fui convidada, mas optei por ficar por aqui.

A conversa foi muito boa, espero que eu consiga estar à altura das espectativas em relação à minha participação na cobertura compartilhada. Este post inclusive está sendo feito para testar a tag proposta para etiquetar o festival em outras redes:
Hoje tem reunião para definição das pautas principais. E amanhã tem encerramento do Ciclo Paranaense de Cultura Digital.

E daqui a pouco eu conto mais. :-)

tags: curitiba, cultura, pr, evento, festivaldeculturapr, pontosdeculturapr

enviada por: fabs em: 14:04 - 17/11    |    permalink    |    comentar

Página 1 de 8